O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) é um imposto estadual que representa a maior parcela da arrecadação das unidades federativas brasileiras.
O ICMS está previsto no artigo 155, II, da Constituição da República de 1988 e em vigor desde 1989, e regulamentado pela Lei Complementar nº 87/1996. Os Estados possuem as suas Leis estaduais próprias que instituem o imposto, bem como os seus regulamentos internos, que geralmente são previstos por meio de Decretos Estaduais.
Nas Constituições de 1934 e 1937, era previsto o imposto sobre vendas e consignações efetuadas por comerciantes e produtores, inclusive os industriais. Na Constituição de 1946, esse imposto foi mantido, sendo também de competência estadual.
Após, a Constituição de 1967 passou a prever o imposto estadual sobre operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por produtores, industriais e comerciantes.
Fato gerador
O fato gerador é a operação de circulação jurídica de mercadoria, a prestação de serviço de transporte, bem como a prestação onerosa de serviço de comunicação por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza.[1] Além disso, o imposto será devido na operação de importação, por ocasião do desembaraço aduaneiro.[2]
Também será fato gerador do imposto a saída de mercadorias junto com a prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviço (ISS), mas apenas quando a própria legislação do ISS determinar que a mercadoria fica sujeita ao ICMS (por exemplo: o item 14.06 da Lista Anexa à Lei Complementar nº 116/2003 dispõe que fica sujeito ao ISS os serviços de manutenção e conservação de máquinas, veículos, aparelhos, equipamentos, motores, elevadores ou de qualquer objeto, exceto peças e partes empregadas, que ficam sujeitas ao ICMS).
Em regra, o imposto não deve incidir em saídas que não representem uma circulação jurídica de mercadoria, por exemplo, uma operação de comodato ou locação, em que a mercadoria ou bem emprestado retornará ao contribuinte que o remeteu.
Base de Cálculo do ICMS
A base de cálculo do imposto é o valor da operação nos casos de circulação de mercadorias.[3] Na prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, a base de cálculo é o preço do serviço.[4]
Já nas operações de importação, a base de cálculo é o valor aduaneiro[5], adicionado do imposto de importação, imposto sobre produtos industrializados (IPI), imposto sobre operações de câmbio (IOF) e quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras.[6]
Vale dizer que o cálculo do ICMS é chamado ‘por dentro’, o que significa dizer que o montante do próprio imposto integra a sua base de cálculo, constituindo o respectivo destaque do imposto na nota fiscal uma mera indicação para fins de controle.[7]
Alíquotas
A alíquota geral do ICMS varia de 17% a 19% nas operações internas, conforme definição estadual. Alguns Estados criaram fundos de combate à pobreza e cobram um percentual adicional de 1% ou 2% de ICMS em determinadas operações. A depender do Estado, esse adicional só é cobrado em operações específicas (por exemplo, com bens considerados supérfluos). Em outros casos, o adicional é cobrado na maioria das operações, como no caso do Rio de Janeiro, o que faz com que a carga de ICMS chegue a 20% ou mais.
No final do ano de 2023, diversos Estados anunciaram um aumento das alíquotas básicas do ICMS aplicáveis às operações internas, alíquotas estas que entraram em vigor no início de 2024. Estados como Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco e Tocantins aumentaram as suas alíquotas, que variavam de 17% a 19%, para a alíquota básica 20% ou mais (fora a existência de cobrança dos adicionais para o fundo de combate à pobreza).
Nas operações interestaduais, as alíquotas aplicáveis são determinadas por resolução do Senado e dependem do Estado de origem e destino das mercadorias, bem como de sua procedência (nacional ou importada).
Se a operação é realizada com mercadoria de procedência nacional, possui origem nos Estados do Sul e Sudeste (excluído Espírito Santo) e tem como destino os Estados das regiões Norte, Nordeste, Centro Oeste (ou também o Estado do Espírito Santo), a alíquota será de 7%.
Em todas as demais operações interestaduais com mercadorias de procedência nacional, a alíquota será de 12%. Ou seja, nas operações interestaduais entre Estados do Norte, Nordeste e Centro Oeste, assim como nas operações destes Estados para os Estados do Sul e Sudeste e, também, nas operações entre os próprios Estados do Sul e Sudeste, a alíquota aplicável será de 12%.
Nas operações interestaduais com mercadorias de origem estrangeira, a alíquota será de 4%,[8] salvo se a mercadoria importada não tiver similar nacional conforme lista editada pelo Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex).[9]
É importante mencionar que a Constituição determina que o ICMS é um imposto que pode ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços.[10] Com isso, os Estados possuem liberdade para listar quais mercadorias são mais essenciais a ponto de ter uma alíquota reduzida de ICMS, bem como quais são os produtos supérfluos, que terão uma alíquota majorada.
Em geral, os Estados atribuem uma alíquota reduzida em função da essencialidade para, por exemplo, produtos de cesta básica, produtos alimentícios, ou outras mercadorias consideradas essenciais de acordo com os critérios estaduais. Por outro lado, nas operações com produtos considerados supérfluos, a alíquota é geralmente maior que 17% ou 18%, como, por exemplo, o caso de comercialização de bebidas alcoólicas, derivados de tabaco e de cosméticos e produtos de perfumaria em que a alíquota pode passar de 25%, a depender do Estado.
Em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou-se que as alíquotas do ICMS para algumas atividades essenciais como energia elétrica e comunicação, não poderiam ser maiores que as alíquotas básicas (vide Recurso Extraordinário (RE) 714139 – Tema 745).[11]
Após essa decisão, foi editada a Lei Complementar nº 194/2022, que alterou a Lei Complementar nº 87/1996, para prever que “As operações relativas aos combustíveis, ao gás natural, à energia elétrica, às comunicações e ao transporte coletivo, para fins de incidência de imposto de que trata esta Lei Complementar, são consideradas operações de bens e serviços essenciais e indispensáveis, que não podem ser tratados como supérfluos”. Assim, a alíquota do ICMS sobre essas atividades não pode ultrapassar as alíquotas básicas instituídas pelos Estados.
Também considerando a essencialidade de determinados produtos ou operações, é possível, ainda, observada a Lei Complementar nº 24/75 os Estados concederem isenções, reduções da base de cálculo, créditos presumidos ou outros incentivos visando reduzir a carga tributária de ICMS, mediante Convênio com os demais Estados. Por exemplo, determinados Estados concedem benefícios para medicamentos, soros e vacinas, produtos derivados da indústria de informática, máquinas agrícolas e industriais, bem como outros produtos/operações de acordo com os critérios estaduais.
Como é calculado o ICMS
O contribuinte do ICMS é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.[12]
O tributo, por força da Constituição, é não cumulativo, ou seja, o imposto debitado na etapa anterior serve como crédito para abater o débito incidente na operação subsequente.[13]
Basicamente, todas as notas fiscais referentes à realização de circulação de mercadoria, prestação de serviços de comunicação, ou transporte intermunicipal e interestadual, que possuem débitos do imposto são escrituradas para verificação do débito total existente. Da mesma forma, o contribuinte deve registrar todos os créditos por entradas de insumos ou mercadorias adquiridas ou recebidas no mesmo mês, assim como os demais créditos permitidos pela legislação[14].
O valor do imposto a ser recolhido decorrerá da existência de débitos por saídas maiores que os créditos por entrada, mediante a escrituração em livro de apuração. Em havendo a situação contrária (créditos maiores que débitos), há possibilidade de utilizar esse saldo credor nas apurações mensais dos períodos subsequentes.
Caso a operação do contribuinte naturalmente gere saldos credores mensais[15], é possível que o Estado autorize a utilização desse saldo para outras finalidades. Por exemplo, há Estados que permitem a utilização desse saldo para pagamento de fornecedores, compra de ativo permanente, pagamento de autos de infração lavrados contra o próprio contribuinte, dentre outras possibilidades.
Algumas operações fogem dessa regra geral de cálculo de débitos e créditos mensais e exigem o pagamento com guia de recolhimento por operação específica realizada. Por exemplo, em operações de saída interestadual para não contribuinte, há necessidade de recolhimento da diferença entre a alíquota interna do Estado de destino e da alíquota interestadual.[16] Geralmente, esse recolhimento deve ocorrer por operação realizada, sendo que o comprovante do recolhimento é enviado junto com a remessa da mercadoria.[17]
Outro exemplo que foge dessa regra é a operação interestadual de mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária em que há Convênio ou Protocolo que atribua a responsabilidade do recolhimento ao estabelecimento remetente. Da mesma forma que no exemplo acima, esse recolhimento geralmente é feito por operação realizada, devendo ser emitida guia específica de recolhimento a cada operação. [18]
Obrigações acessórias do ICMS
As principais obrigações acessórias são as Notas Fiscais eletrônicas (NF-e) e o documento auxiliar da NF-e (DANFE). Dependendo da operação, emite-se a Nota Fiscal de Consumidor eletrônica (NFC-e, por exemplo, em vendas presenciais ou delivery), Nota Fiscal/Conta de Energia Elétrica, Nota Fiscal de Serviço de Transporte, Conhecimento de Transporte de Cargas, Nota Fiscal de Serviço de Comunicação, dentre outras.
Além dessas obrigações, há a necessidade de apresentação mensal da Escrituração Fiscal Digital (EFD-ICMS/IPI, também conhecida como SPED-fiscal). Essa obrigação reúne basicamente o Livro Registro de Entradas, Livro Registro de Saídas, Livro Registro de Inventário, Livro Registro de Apuração do IPI, Livro Registro de Apuração do ICMS, documento Controle de Crédito de ICMS do Ativo Permanente (CIAP), Livro Registro de Controle da Produção e do Estoque.
Alguns Estados possuem outras obrigações acessórias, como a GIA (Guia de Informação e Apuração do ICMS), em São Paulo, que basicamente reúne informações semelhantes em relação ao SPED-Fiscal, mas de forma mais simples, ou a DIEF (Declaração de Informações Econômico-Fiscais) em outros Estados.
Demais informações relevantes sobre o ICMS
O ICMS possui função eminentemente arrecadatória, não possuindo objetivo extrafiscal. A sua majoração deve ocorrer por Lei (e não por mero decreto) e, ainda, fica sujeito tanto à anterioridade nonagesimal[19] quanto àquela referente ao exercício financeiro seguinte[20].
Uma informação importante é que, nas operações de transferências entre estabelecimentos do mesmo titular, o STF já decidiu que essa operação não deveria ser sujeita ao pagamento do ICMS, uma vez que não representa uma circulação jurídica, sendo um mero deslocamento físico de mercadorias entre estabelecimentos.[21] Assim, foi publicada a Lei Complementar nº 204/2023, que alterou a Lei Complementar nº 87/1996, para passar a prever que a “não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro de mesma titularidade (…)”. No entanto, houve uma dúvida acerca do crédito de ICMS escriturado no estabelecimento de origem e como ele poderia ser transferido ao estabelecimento de destino. Assim, os Estados publicaram o Convênio ICMS 178/2023, o qual estipulou que o crédito de ICMS do estabelecimento de origem deve ser transferido ao estabelecimento de destino mediante débito na própria Nota Fiscal de transferência, o que o STF teria justamente determinado que não deveria existir. Na prática, portanto, atualmente os Estados continuam exigindo o débito de ICMS nas operações de transferência entre estabelecimentos do mesmo titular.
Da receita de arrecadação dos Estados com o ICMS, 25% pertencem aos municípios.[22] Essa parcela será creditada em favor do município de acordo com o seguinte critério[23]: (i) 65%, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; (ii) até 35%, de acordo com o que dispuser lei estadual, observada, obrigatoriamente, a distribuição de, no mínimo, 10 (dez) pontos percentuais com base em indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos.
Há diversas discussões judiciais que envolvem o imposto como, por exemplo, cobrança do diferencial de alíquotas nas operações interestaduais para contribuintes e não contribuintes do imposto, alíquotas muito altas que violam o princípio da seletividade, multas abusivas que incidem sobre o valor da operação e não sobre o valor do imposto devido (caráter confiscatório de multa isolada), glosa de créditos por documento fiscal inidôneo na aquisição de bens, glosa de créditos nas aquisições interestaduais de mercadorias que tiveram benefício fiscal no Estado de origem, incidência ou não de ICMS nas operações de industrialização por encomenda, incidência ou não do ICMS nas operações de comercialização de softwares, incidência ou não de ICMS na venda de ativo permanente, cobrança antecipada do ICMS nas operações interestaduais.
Esses são os aspectos fundamentais e elementares para a compreensão deste tributo que onera todas as mercadorias, incluindo os minerais, e ainda energia elétrica, transporte intermunicipal e de comunicação.
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[1] Art. 2º, III, Lei Complementar 87/96.
[2] Art. 2º, §1º, I, Lei Complementar 87/96.
[3] Art. 13, Lei Complementar 87/96.
[4] Art. 13, III, Lei Complementar 87/96.
[5] Que geralmente compreende o valor das mercadorias adicionado do frete e seguro internacionais.
[6] Art. 13, V, Lei Complementar 87/96.
[7] Art. 13, §1º, I, Lei Complementar 87/96.
[8] Resolução do Senado Federal 13/2012.
[9] Atualmente essa lista pode ser consultada no seguinte link: https://www.gov.br/mdic/pt-br/assuntos/camex/estrategia-comercial/lista-de-bens-sem-similar-nacional-para-efeitos-da-resolucao-13-2012-do-senado-federal
[10] Art. 155, §2º, III.
[11] Vide https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15350102911&ext=.pdf
[12] Art. 4º, Lei Complementar 87/96.
[13] Art. 19, Lei Complementar 87/96.
[14] Por exemplo, crédito sobre o ativo permanente, de acordo com o art. 20, §5º, Lei Complementar 87/96.
[15] Por exemplo, aquisições internas com crédito de 18% e vendas interestaduais com débito de 7%.
[16] Convênio ICMS 93/2015.
[17] Caso o contribuinte remetente tenha inscrição estadual no Estado de destino, é possível realizar o recolhimento mensal mediante elaboração de uma apuração do ICMS, sem a necessidade de realização de recolhimento por operação realizada.
[18] Da mesma forma que na operação interestadual para não contribuinte, nos casos de recolhimento do ICMS-ST devido pelo remetente ao Estado de destino, é possível solicitar inscrição estadual no destino para realizar o recolhimento mensal, em vez de realizar o pagamento por operação realizada.
[19] Art. 150, III, ‘c’, da Constituição da República.
[20] Art. 150, III, ‘b’, da Constituição da República.
[21] Vide decisão de improcedência na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49: https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15346309843&ext=.pdf
[22] Art. 158, IV, da Constituição da República.
[23] Art. 158, parágrafo único, da Constituição da República.
RODRIGO FRANCISCON
Associado da área Tributária do Veirano Advogados.
Fonte: Jota.info